04 jan - Recomecemos, recomecemos) de verdade. Invoquemos o Espírito Santo para que nos ilumine e caminhemos na presença de Deus com a simplicidade da criancinha que se diverte sob os olhos da mãe. (L 23). São José Marello
Mateus 2,1-12 04 JAN 2026
"Depois que
Jesus nasceu na cidade de Belém da Judeia, na época do rei Herodes, alguns
magos do Oriente chegaram a Jerusalém, perguntando: "Onde está o rei dos
judeus que acaba de nascer? Vimos a sua estrela no Oriente e viemos
adorá-lo". Ao saber disso, o rei Herodes ficou alarmado, assim como toda a
cidade de Jerusalém. Ele reuniu todos os sumos sacerdotes e os escribas do
povo, para perguntar-lhes onde o Cristo deveria nascer. Responderam: "Em
Belém da Judeia, pois assim escreveu o profeta: 'E tu, Belém, terra de Judá, de
modo algum és a menor entre as principais cidades de Judá, porque de ti sairá
um príncipe que será o pastor do meu povo, Israel'". Então Herodes chamou,
em segredo, os magos e procurou saber deles a data exata em que a estrela tinha
aparecido. Depois, enviou-os a Belém, dizendo: "Ide e procurai obter
informações exatas sobre o menino. E, quando o encontrardes, avisai-me, para
que também eu vá adorá-lo". Depois que ouviram o rei, partiram. E a
estrela que tinham visto no Oriente ia à frente deles,
até parar sobre o lugar onde estava o menino. Ao observarem a estrela, os magos
sentiram uma alegria muito grande. Quando entraram na casa, viram o menino com
Maria, sua mãe. Ajoelharam-se diante dele e o adoraram. Depois abriram seus
cofres e lhe ofereceram presentes: ouro, incenso e mirra. Avisados em sonho
para não voltarem a Herodes, retornaram para a sua terra, passando por outro
caminho."
Reflexão para Solenidade da Epifania
do Senhor Mateus 2,1-12)
Celebramos neste domingo a solenidade da Epifania
do Senhor,
concluindo o tempo do Natal. Epifania quer dizer manifestação, deriva do verbo
grego “epifaino” (επιφαινω), cujo significado literal é manifestar, aparecer, resplendecer. Nesta
solenidade celebramos, então, a manifestação de Deus em Jesus como luz, guia e
Senhor de todo o universo, embora o texto evangélico proposto, Mateus 2,1-12,
apresente um movimento oposto: é o mundo com sua pluralidade de raças e
culturas, representado pelos magos do Oriente que manifesta sua adesão e
aceitação ao senhorio de Jesus, indo ao seu encontro.
O texto evangélico referido é muito rico em
teologia e simbologia e, sobretudo, belo e encantador. Infelizmente, ao longo
da história, foi interpretado mais folcloricamente do que teologicamente. Daí a
dificuldade de apresentarmos uma interpretação mais fidedigna às intenções do
autor, tendo em vista que as interpretações folclóricas, consolidadas pelo
cristianismo oficial, estão muito enraizadas no imaginário popular. Nossa
reflexão visa adentrar no texto em seu sentido teológico original.
Antes de tudo, devemos esquecer a linda e romântica
imagem do presépio para compreendermos bem o texto bíblico, partindo dos
primeiros versículos: “Tendo nascido Jesus na cidade de Belém, na Judéia, no
tempo do rei Herodes, eis que alguns magos do Oriente chegaram a Jerusalém,
perguntando: ‘Onde está o rei dos judeus que acaba de nascer? Nós vimos a sua
estrela no Oriente e viemos adorá-lo” (v. 1-2). Percebemos que Mateus, ao
contrário de Lucas, não narra o momento do nascimento de Jesus, apenas o
menciona como um fato já acontecido, dando, porém, informações importantes de
tempo e espaço: nasceu em Belém, no tempo do rei Herodes.
A princípio, já é possível perceber a intenção do
autor com essa informação: está surgindo uma alternativa de poder e realeza
diferente do sistema vigente; há um deslocamento do centro para a periferia, ou
seja, começa uma descentralização, o que vem a indicar que o poder, exercido
até então na capital, está ruindo. É claro que é necessário o complemento da
informação para termos clareza da oposição que o autor quer apresentar entre o
poder centralizado e o projeto alternativo que surge: “nasceu um rei para os
judeus” (v. 2). As indicações de tempo e espaço também servem para legitimar a
historicidade do homem Jesus de Nazaré. Ora, os cristãos da comunidade de
Mateus não tinham conhecido o Jesus terreno e, por isso, poderiam questionar a
sua existência. Com esses dados, o evangelista quer reforçar que Jesus foi um
homem concreto, gente de carne e osso que nasceu e viveu em um período
histórico determinado.
A outra grande novidade do relato, percebida ainda
no primeiro versículo, está na peculiaridade dos personagens apresentados pelo
autor: “alguns magos do Oriente” (v. 1); Ora, os magos, em grego “magoi” (μαγοι), eram estudiosos orientais, responsáveis pela interpretação
dos sonhos e pela leitura dos fenômenos
naturais, mas também
eram vistos como feiticeiros e charlatões,
operadores da magia e sacerdotes de cultos pagãos da Pérsia e Babilônia,
portanto, pertenciam a uma categoria condenada pelo judaísmo e pelo
cristianismo das origens; de fato, dois episódios nos ajudam a perceber o
quanto a magia era condenada pela Bíblia: a saga de Balaão no Antigo Testamento
(cf. Nm 22 – 23), e a tentativa de compra do dom do Espírito Santo pelo mago
Simão no Novo Testamento (cf. At 8,9-24). Portanto, os magos eram pessoas
abomináveis à luz da religião de Israel e dos primeiros cristãos.
Infelizmente, a tradição cristã revestiu os magos
de características que não eram suas, ao caricaturá-lo de reis. Ao invés de
ajudar na compreensão do texto, esse tratamento real aos magos distorceu
completamente o sentido aplicado por Mateus ao criar personagens tão
peculiares. É importante reforçar que esses personagens são fruto da
inteligência e criatividade teológica do evangelista, ou seja, os magos não são
personagens reais, mas simbólicos. A intenção do evangelista e de sua
comunidade ao apresentar tais personagens era exatamente mostrar que também aos
distantes e sem reputação Deus se revela, e são exatamente esses os que com
mais sinceridade buscam o verdadeiro rosto de Deus, tão difícil de ser
reconhecido na pessoa de uma frágil e pobre criança, como as elites, religiosa
e política, não foram capazes de reconhecer.
Ainda sobre o revestimento dado pela tradição, é
importante recordar que o texto bíblico não faz menção alguma ao número dos
magos; não diz que eram três, como propagou a tradição, com base apenas no
número dos dons por eles oferecidos: ouro, incenso e mirra. Além do número
três, sem fundamento algum no texto bíblico, a tradição lhes deu nomes (Gaspar,
Baltasar e Melchior) e meio de transporte (camelos). Por isso, como afirmamos
no início, é necessário deixar de lado a imagem fantasiosa do presépio para
compreender bem o texto de Mateus.
Está mais do que clara a oposição: os magos vieram
de longe para adorar ao Deus verdadeiro. Foram a Jerusalém, mas lá não era
possível encontrar o verdadeiro Deus porque a elite religiosa o tinha
monopolizado e distorcido; como gentios, os magos eram barrados pelas paredes
do templo que segregava os pagãos dos judeus piedosos. Com a pergunta “Onde
está o rei dos judeus que acaba de nascer?” (v. 2a), os magos afirmam que não
reconhecem a autoridade de Herodes, ou seja, o consideram um rei ilegítimo; com
a afirmação “nós vimos sua estrela no Oriente e viemos adorá-lo” (v. 2b), eles
desafiam também a elite religiosa, mostrando que as paredes do templo já não
conseguem mais conter esse Deus que se revela em todo o universo e a todos os
povos. Portanto, os poderes político e religioso são ameaçados com o nascimento
de Jesus.
Enquanto Herodes exercia o poder pela força e a
violência, Jesus exercerá a sua autoridade pelo serviço; enquanto a relação com
Deus, monopolizado pela elite religiosa, era mediada por uma casta sacerdotal
corrompida e através de sacrifícios e ofertas, em Jesus é Deus quem se
manifesta plenamente, sendo Ele mesmo quem à humanidade se oferece, ao invés de
exigir oferendas. Por isso, “o rei Herodes ficou perturbado, assim como toda
Jerusalém” (v. 3), pois viam que um novo tempo estava surgindo, novas relações
estavam sendo gestadas, uma sociedade alternativa estava nascendo, enfim, o
Reino de Deus estava começando e, portanto, todos os reinos humanos deveriam
desaparecer.
As preocupações de Herodes e de “toda Jerusalém”,
compreendida como a elite política, religiosa e intelectual predominantes, ou
seja, sacerdotes e escribas, leva-os a um medíocre pacto (vv. 4-6), o qual se
repetirá posteriormente e levará Jesus à morte de cruz, com as mesmas
motivações: o medo que as autoridades tinham de um autêntico “Rei dos Judeus”.
No nascimento, o pacto é feito entre Herodes e toda Jerusalém; na paixão será
entre Pilatos e o sinédrio, mas são as mesmas forças, com as mesmas práticas.
Como último recurso, Herodes tenta a fraude e o suborno, exigindo que os magos
retornem a ele quando encontrassem o menino (vv. 7-8).
Ajudados pela Escritura e pelo próprio Herodes, os
magos foram a Belém e lá, de fato, encontraram o que estavam procurando: Jesus,
Deus e luz que ilumina todos os povos, inclusive eles, operadores de práticas
abomináveis aos olhos do judaísmo. A reação deles não poderia ser outra: “Ao
verem de novo a estrela, os magos sentiram uma alegria muito grande” (v. 10). A
luz de Deus, até então sufocada por uma religião ritualista e segregadora,
agora ilumina o universo inteiro e o convida a alegrar-se com isso, pois
significa o fim de todas as barreiras, o desmoronamento de todos os muros e
sinais de separação.
Certamente, a alegria deles aumentou ainda mais
“Quando entraram na casa, viram o menino com Maria, sua mãe” (v. 11a). Por
serem pagãos e magos, eles não podiam adentrar mais que o pátio do templo
reservado para os gentios e, portanto, não podiam contemplar nem adorar
verdadeiramente. Agora, é tudo diferente: eles entram e vêem porque é o próprio
Deus quem se deixa ver e conhecer em Jesus e na comunidade cristã,
personificada em Maria, a mãe. Essa passagem é muito importante, pois em todo o
primeiro capítulo de Mateus houve uma centralidade e importância dadas à figura
de José; nessa cena, ele não é mencionado, mas apenas Maria; em Lucas, “os
pastores encontraram Maria, José e o recém-nascido” (cf. Lc 2,16). Certamente,
Mateus teve uma intenção especial com esse detalhe: quis mostrar que Deus se
deixa conhecer parcialmente na criação, através da estrela (vv. 2.9.10), na
Escritura (vv. 4-6), mas de modo pleno, só é possível fazer uma verdadeira e
autêntica experiência com Ele na comunidade reunida, personificada em Maria (v.
11).
É necessário recordar o que o texto diz, desde o
início, sobre o objetivo dos magos: adorar o rei dos judeus (v. 2). Tinham
empreendido um longo caminho, inclusive errando a rota, pois foram primeiro a
Jerusalém, mas lá não o encontraram, devido a estrutura rígida e decadente da
religião oficial. Somente deslocando-se para a periferia puderam, de fato,
experimentar o Deus que tanto buscavam. Aqui, está o ápice do contraste que o
evangelista quer apresentar: o templo perdeu seu sentido, Deus não habita mais
nele; é necessário retirar-se para a periferia, inserir-se na comunidade e,
assim, adorar e experimentar a beleza desse Deus que quer apenas misericórdia e
amor, e não mais sacrifícios.
Quando perceberam que encontraram aquele que tanto
buscavam, “ajoelharam-se diante dele e o adoraram” (v. 11). Essa atitude mostra
que, finalmente, saciaram-se, encontraram sentido para suas vidas e, portanto,
esvaziaram-se de si, oferecendo tudo o que haviam. Não ofereceram porque lhes
fora exigido, como exigia o templo, mas porque sentiram-se confortados e
correspondidos. Enquanto os poderes oficiais se uniam para matar, os magos,
como figuras dos marginalizados, se prostram unidos para adorar. A adoração
verdadeira, ou seja, o autêntico culto, não depende mais de um espaço
específico delimitado pela religião; é feita na própria casa; a única exigência
é que seja feita em “espírito e em verdade” (cf. J 4,24).
É claro que os presentes oferecidos pelos magos,
ouro, incenso e mirra (v. 11b) são simbólicos e revelam, por um lado a
identidade de Jesus e, por outro, a nova relação entre a humanidade e Deus. O
ouro, revela que Jesus é rei enquanto o recebe, mas ao mesmo tempo diz que
todas as nações podem participar do seu reino, enquanto foi oferecido por
pagãos; assim, o privilégio de Israel como povo escolhido perde o seu sentido,
pois a pertença ao Reino de Deus não é determinada por raça ou cultura, mas
pela sinceridade de coração. O incenso representa a divindade de Jesus, ou
seja, é o reconhecimento de que Ele é Deus, mas a humanidade não precisa mais
dos sacerdotes do templo para se comunicar com Ele, pois qualquer pessoa e em
qualquer lugar pode fazer isso. A mirra é o mais ambíguo dos três presentes: é,
antes de tudo, o sinal da humanidade de Jesus, uma vez que era um perfume usado
pelos judeus para embalsamar os cadáveres, como acontecera com o corpo do
próprio Jesus, quando morreu; porém, no Cântico dos Cânticos, em diversas
passagens, a mirra é citada como o perfume da esposa amada (cf. Ct 5,5.13) e,
com muita probabilidade, Mateus quis dizer que a esposa amada de Deus deixou de
ser Israel e passou a ser toda a humanidade.
Na conclusão do texto, encontramos uma afirmação
muito significante para a comunidade cristã de todos os tempos: “Avisados em
sonho para nãos voltarem a Herodes, os magos retornaram para sua terra seguindo
outro caminho” (v. 12). Seguir outro caminho é a primeira atitude de quem faz
um encontro autêntico com Deus. Desse encontro, surge uma nova maneira de
relacionar-se com Deus e com o próximo. Consequentemente, brota uma nova
mentalidade que rejeita qualquer forma de poder que oprime e até mata,
inclusive amparado pela religião, como o complô de Herodes com os sacerdotes do
templo. Para viver bem a nova relação com Deus é necessário desviar-se das
antigas rotas e estruturas, como fizeram os magos, ao perceberem que Jerusalém
só oferecia exploração e perigo. A experiência autêntica com Deus, portanto,
provoca no ser humano a necessidade de percorrer novos caminhos, o que pode ser
compreendido como uma nova maneira de viver, com novas atitudes parecidas com
as de Jesus.
Concluindo, podemos deixar como reflexão
permanente: uma vez que concluímos o tempo do Natal, quais os caminhos que
iremos percorrer de agora em diante? Se serão os caminhos de sempre, ou seja,
se continuarmos com as mesmas maneiras de pensar e compreender as coisas,
principalmente a nossa relação com Deus e o próximo, Jesus não nasceu em nós...
e, se não nasceu, não poderemos manifestá-lo ao próximo!
Lembre-se de que todos colhem somente
o que plantam.
Por isso, semear amor, bondade,
amizades, otimismo e pensamentos positivos é a melhor prática.
Então plante sementes boas, repletas
de amor, para colher frutos de alegria e felicidade.
Senhor, que as pessoas sejam terra
fértil e que tua vontade se realize na vida de todos.
Confirmação
Saiu o semeador a semear.
Algumas sementes caíram à beira do
caminho;
como não tinham raiz, secaram.
Outras, em terreno pedregoso; quando o
sol saiu, ficaram queimadas; outras caíram no meio dos espinhos; no entanto,
nenhuma delas vingou.
Por fim, uma parte caiu em terra boa e
produziu frutos (cf. Mt 13,3-8)



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