26 fev - Repitamos sempre: “Omnia cooperantur in bonum” tudo
coopera para o bem, até nas menores coisas, como já há tempo a experiência nos
tem ensinado. (L 167).SÃO JOSE MARELLO
Lucas 6,36-38
Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 36“Sede misericordiosos, como também o vosso Pai é misericordioso. 37Não julgueis e não sereis julgados; não condeneis e não sereis condenados; perdoai, e sereis perdoados. 38Dai e vos será dado. Uma boa medida, calcada, sacudida, transbordante será colocada no vosso colo; porque com a mesma medida com que medirdes os outros, vós também sereis medidos”.
Meditação:
Lucas
é o evangelista da misericórdia de Deus. Várias e belas são suas parábolas
sobre a misericórdia. Enquanto que Mateus, referindo-se a uma sentença de Jesus,
escreve: "Sede perfeitos como vosso Pai Celeste é perfeito" (Mt
5,48), em Lucas temos: "Sede misericordiosos como vosso Pai é
misericordioso".
Lucas prefere destacar a misericórdia como atributo de Deus do que a sua
perfeição. O imperativo, "amai vossos inimigos", é repetido por duas
vezes, como prática concreta da misericórdia. A figura do "inimigo" é
uma presença constante no Primeiro Testamento.
A
própria imagem de Deus fica envolvida com o "inimigo" quando se lê no
livro do Êxodo (23,2) a mensagem de Javé: "Serei inimigo dos teus inimigos
e adversário dos teus adversários". Jesus remove a concepção do
"inimigo", a qual justifica atitudes excludentes e elitistas, que
respaldam a violência e a afirmação do poder.
No imenso tesouro do Evangelho, a misericórdia é como uma gema preciosa: sólida
e delicada ao mesmo tempo; verdadeira e transparente na sua simplicidade;
brilhante pela vida e alegria que difunde. Compaixão, solidariedade, ternura e
perdão são como seus ângulos de polimento, por onde se reflete – em raios
coloridos e acessíveis – o amor regenerador de Deus.
Neste tempo da Quaresma, a misericórdia de
Deus se traduz em resgate, cura, abrigo, libertação, sustento, proteção,
acolhida, generosidade e salvação – tão marcantes na caminhada do Povo de Deus.
No
decorrer dos séculos, a comunidade cristã tem atualizado esta experiência em
novos contextos, lugares e relacionamentos. A liturgia a celebra; a prece a
invoca; a pregação a proclama; os místicos a enfatizam; o magistério a propõe;
as obras a cumprem.
Antiga
e sempre nova, a misericórdia de Deus se pode entender em outras palavras sob
três pontos: bem-aventurança, profecia e terapia. Como bem-aventurança, a
misericórdia aproxima o Reino de Deus das pessoas, e as pessoas do Reino de
Deus. É prática que dignifica o ser humano: tanto quem a dá, quanto quem a
recebe. Está repleta de gratuidade e alegria, como disse Jesus: “Felizes os
misericordiosos, pois alcançarão misericórdia” (Mt 5,7).
As
obras de misericórdia são também profecias da justiça do Reino, que supera toda
fronteira de raça, credo ou ideologia: diante da humanidade ferida e carente,
somos servidores da vida e da esperança, dentro e fora da Igreja, para crentes
e não-crentes, afim de que “todos tenham vida e vida em plenitude” (Jo 10,10).
Jesus
nos indicou o exemplo do bom samaritano para mostrar a todos que a misericórdia
não aceita fronteiras! Enfim, a misericórdia é também terapia: compaixão que
restaura, toque que regenera e cuidado que aquece.
As
obras de misericórdia têm eficácia curadora: socorrem nossa humanidade ferida
pelo pecado e pelo desamor, restaurando em nós a imagem do Cristo glorioso,
para que suas feições resplandeçam na nossa face, na face da Igreja, na face de
toda a humanidade redimida.
Se
a compaixão é um sentir que nos comove na direção do próximo, a misericórdia se
caracteriza como gesto que realiza este sentir solidário. Na compaixão temos um
sentimento que mobiliza; na misericórdia temos o exercício deste sentimento.
Daí os verbos: cumprir, mostrar, fazer e agir – que expressam a eficácia do
amor misericordioso humano e, sobretudo, divino (Ex 20,6; Sl 85,8; Lc 1,72 e
10,37).
A
misericórdia tem caráter operativo: é amor em exercício de salvação. Se o amor
é a qualidade essencial de Deus; a misericórdia é este mesmo amor exercitado
para com a criatura humana, revelando a qualidade ativa de Deus.
Assim,
a misericórdia se mostra muito mais na experiência do dia a dia, do que na
conceituação teológica, catequética ou espiritual. E ainda que tal experiência
se revista de beleza, o lar da misericórdia não é o discurso e nem explicações.
Porque as crianças abandonadas, os andarilhos e os excluídos da sociedade não
comem explicações.
O
lar da misericórdia é a solidariedade. Seu órgão vital é o coração e as mãos:
erguem o caído, curam o ferido, abraçam o peregrino, alimentam o faminto.
Deus
é bondoso para com os ingratos e os maus. Não lhes inflige castigos e
sofrimentos para que se arrependam. Conquista-os pelo amor, pela misericórdia e
pela mansidão. Contudo, isto não deve impedir o uso do discernimento para
reconhecer as responsabilidades diante do mal praticado. Este discernimento,
contudo, não deve levar a um julgamento de condenação. Acima de tudo vigora o
perdão e a misericórdia que reanimam a vida.
A misericórdia que Deus exige de ti e de mim não é outra senão a evangélica,
que consiste em 14 obras: 7 corporais: dar de comer a quem tem fome, dar de
beber a quem tem sede, acolher o forasteiro, vestir quem está nu, visitar os
doentes e assistir aos prisioneiros e sepultar dignamente os mortos.
Sete
obras, centradas na exortação “cada vez que o fizestes a um desses meus irmãos
mais pequeninos, a mim o fizestes” (25,40). E 7 espirituais: dar bom conselho a
quem necessita, ensinar os ignorantes, corrigir os que erram, consolar os
aflitos, perdoar as ofensas, suportar com paciência as fraquezas do próximo,
rogar a Deus pelos vivos e mortos.
Obras
de misericórdia corporais: dar de comer ao faminto, dar de beber ao sedento,
vestir os maltrapilhos, abrigar os peregrinos, cuidar dos enfermos, visitar os
encarcerados,
Em
Emaús e à beira do lago da Galiléia, Jesus toma o pão, abençoa e reparte: os
discípulos o reconhecem, por causa de seu tato característico (Lc 24,30; Jo
21,12-13). Que gestos tens feito para que as pessoas te reconheçam como
discípulo de Jesus? Os gestos alimentam, curam e restauram! Eles são toques da
misericórdia de Deus.
O
nosso mandato é a prática da misericórdia para com o irmão: “Vai e faze o
mesmo!”
Reflexão Apostólica:
A alegria do perdão é concedida por etapas: primeiro, experimentando
a compaixão que é "sentir com o outro" a carência, a necessidade de
curar seu interior, no dizer do próprio Evangelho, e Jesus ressalta: "como
é compassivo o vosso Pai". O segundo momento que envolve a dádiva do
perdão é não julgar, nem condenar, pois, no sentido mais estrito, nem mesmo
Deus julga ou condena.
Com freqüência nós manifestamos atitudes de julgar e condenar.
Essa atitude não é divina e, portanto, tampouco pode ser nossa; de onde, pois,
inventamos que nós temos poder para tal?
Finalmente, seguindo os passos sugeridos por Jesus, perdoar para
sermos perdoados. A maior parte de nossa vida gira ao redor dessa necessidade
de manter sã a nossa consciência e nossas relações com os demais.
Alguns poderiam dizer que nas relações com os outros, o termômetro
que mede o grau de verdade, o grau de crescimento e até de humanização das
nossas relações, é a capacidade de perdoar ou a incapacidade de pedir perdão e
também de outorgá-lo. Na observação simples e despretensiosa, observa-se que o
mais necessitado de perdão é aquele que tem mais problemas para perdoar.
Neste Evangelho Jesus nos ensina a usar a misericórdia como medida
para todas as nossas ações. Não julgar, não condenar, perdoar e dar são
realidades que nós podemos vivenciar a cada dia da nossa vida e que nos põem em
sintonia com a misericórdia do Pai.
Tudo o que praticarmos será a medida para que também o Pai faça
conosco. Se usarmos a nossa medida com a misericórdia, receberemos
misericórdia, se usarmos a nossa medida com ódio, intolerância, incompreensão,
também assim a receberemos de volta, em porção dobrada.
Se não julgarmos, não seremos julgados; se não condenarmos, não
seremos condenados, se perdoarmos, seremos perdoados, se dermos, também
receberemos. É uma lei natural, a mesma medida de misericórdia que usarmos nos
nossos relacionamentos nós a receberemos, “calcada, sacudida, transbordante”,
isto é, plena, cheia. Isso vale, tanto para o bem como para o mal. Deus ama a
nossa miséria, mas espera que nós também acolhamos a miséria do nosso próximo
da mesma forma como Ele acolhe a nossa.
Por isso, não podemos nos confundir! Se apreendermos os conselhos
do Mestre, nós estaremos sendo misericordiosos como o Pai é misericordioso.
Você tem agido conforme os conselhos de Jesus? Você se acha
uma pessoa misericordiosa? Você faz aos outros o mesmo que você queria que
fizessem com você? Com que você tem transbordado a sua medida: com misericórdia
ou intolerância? O que você espera receber ainda aqui nesta vida: misericórdia
ou intolerância?
Propósito:
Pai, dispõe meu coração para o perdão, pois este é o
caminho pelo qual estabeleço minha comunhão contigo.
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