04
de outubro - No segredo se forma o herói,
tal como desabrocha a semente na natureza. (L
23). São Jose Marello
Lucas 10,38-42
- O senhor não se importa que a
minha irmã me deixe sozinha com todo este trabalho? Mande que ela venha me
ajudar.
Aí o Senhor respondeu:
- Marta, Marta, você está agitada e
preocupada com muitas coisas, mas apenas uma é necessária! Maria escolheu a
melhor de todas, e esta ninguém vai tomar dela."
Paulo se dirige aos fiéis da Galácia (Gl 1,13-24) para fazer uma espécie de apologia pessoal. A atitude dos gálatas provocou no apóstolo a necessidade de lhes esclarecer o seguinte:
Primeiro,
que todo judeu era zeloso de sua religião e das tradições de seus pais, mas
intolerante com todo aquele que tentasse sequer desfazer-se daquelas tradições
até o extremo de persegui-los.
Chamado, contudo, por aquele mesmo a quem perseguia fora enviado a pregar o Evangelho da graça, primeiro a seus correligionários e logo aos gentios. Paulo esclarece que ao ter recebido diretamente a revelação de Jesus Cristo não considerou necessária a autoridade dos outros apóstolos para dar início a seu trabalho evangelizador.
Para
Lucas, Jesus é o homem livre e libertador. Um homem comum daquela época não
teria entrado na casa dessas mulheres a não ser que estivesse em companhia de
um homem. É que não era comum que a mulher recebesse a visita de um varão.
Com
Jesus, o Evangelho começa pelo mais humilde, pelo mais marginalizado, mas isso
não é compreendido por todos.
As coisas continuam iguais para ela, seu papel de mulher conhecedora do que tem de fazer quando há hospede em casa, não muda. Não pode entender o que acontece com Maria. Seu apego ao que é mandado, ao que está estabelecido não lhe permite ver, e menos ainda experimentar, a novidade do reino trazida por Jesus que se deu ao trabalho de a levar até sua própria casa.
Na
prática, a resposta de Jesus a Marta é esta: “trata de quebrar tantas barreiras
para que possas experimentar a mesma alegria, o mesmo sentimento de Maria”.
Jesus,
que vai subindo para Jerusalém, detectou, ao longo de seu ministério na
Galiléia e pelo caminho, estas duas atitudes: captação da novidade do reino e
“abandono”, relativização em tudo mais. Resistência, não tanto rejeição, mas
resistência. Lucas condensa esta constatação no relato da visita a Marta e
Maria.
Esta narrativa foi tardiamente interpretada na Igreja como se a opção pela vida contemplativa fosse melhor do que a vida ativa.
Com certeza, se consideramos superficialmente e fora do contexto algumas ações aqui narradas, podem-nos parecer injustas como, por exemplo, a atitude de Maria que não ajuda Marta nas tarefas domésticas. Mas se olharmos para além do ato mesmo e nos perguntarmos pelos motivos que levaram Maria a subtrair-se dos afazeres de casa, entenderemos que não é por preguiça, mesquinhez ou falta de solidariedade.
Ela deseja ocupar-se com algo de suma importância, aproveitar uma ocasião única, levando-se ainda em conta sua condição feminina: “ouvir os ensinamentos de Jesus”.
O que poderia ter maior importância que aprender as
palavras de Jesus de seus próprios lábios, aprofundar seu significado,
encontrar-se entre os privilegiados que podiam ouvi-lo diretamente, entre
aqueles que podiam perguntar-lhe por sua correta interpretação?
O próprio Jesus nos orienta acerca de ficarmos atentos “a coisas melhores”, às únicas que são realmente importantes. Quantas vezes nos deixamos imbuir pelos afazeres cotidianos, pelos cuidados do dia-a-dia? Quantas vezes, ficamos soterrados por montanhas de trabalho, de tarefas importantes, sim, mas não substanciais? Quantas vezes privilegiamos o atendimento do urgente em detrimento do que realmente é importante?
As palavras de Jesus nos convidam a fazer uma parada em nossos frenéticos trabalhos cotidianos para refletir sobre o transcendental; para aprender sobre seus próprios ensinamentos.
Costumamos pensar que os que se dedicam à vida contemplativa, quer dizer, consagram-se a Deus para viver num convento ou mosteiro de clausura, assumiram o papel de Maria de Betânia, enquanto os demais, que nos dedicamos à luta pela sobrevivência, à atividade pastoral e a enfrentar os problemas do dia a dia, optamos pela parte de Marta. Contudo esta divisão severa de papéis corresponde à mensagem do Evangelho.
Lucas nos convida a ‘escolhermos a melhor parte’, quer
dizer, a de nos convertermos em ouvintes e servidores de Jesus; para que,
reconhecendo quando ele se manifesta em nossa vida, nos disponhamos a escutá-lo
sem titubeios.
Certamente, como cristãos, não podemos renunciar à
dimensão contemplativa da relação com Deus, porque é o fundamento de nossa
identidade discipular.
Se não nos fizermos ouvintes dos ensinamentos do Mestre,
o que iremos anunciar? Se não formos servidores de sua Palavra, em que vamos
crer?
Temos de vencer os pudores e vergonhas do cristianismo convencional, e nos pormos em contato com os pés do Mestre para descobrir neles o caminho que nos conduz para o Reino.
Devemos nos aproximar dessa humanidade simples do Mestre
de Nazaré, para descobrir em seus ensinamentos o mistério de sua divindade escondida
pelos séculos.
A maior parte de nós – e de modo primordial os leigos – é chamada a testemunhar Cristo, vivendo no mundo, para procurar sua transformação de acordo com o Evangelho como perfeito “fermento na massa”. Compatibilizar os dois papéis implica uma sabedoria que temos de pedir a Deus com humildade e constância.
Vivemos num mundo apressado hoje. Corre para aqui corre para lá! Mas nos esquecemos que correr não quer dizer crescer. Na fúria consumista, o homem perde os valores da contemplação e da prece.
O Senhor pede para parar um pouco e ouvir. Escute Deus falar-lhe das coisas do céu! Não tenha pressa de sair quando está na missa. Ou na oração. Esqueça o tempo do mundo e viva o tempo da graça de Deus e com Deus.
Você escuta voluntariamente a Palavra de Deus? Na missa,
o sermão não se torna enjoativo? O povo prefere estar parado na frente da
televisão. O jornal e o rádio têm preferência à palavra divina proclamada na
igreja.
Existem muitas “Santas Martas” que convivem em nosso meio: mães, avós, tias, vizinhas, amigas, que nos acolhem tão bem em suas casas, por mais ingratos que sejamos. Elas apenas oferecem o que têm de melhor. E, às vezes, precisam ser lembradas que ainda mais importante do que deixar a casa impecável para recebê-lo, é preciso abrir a porta do coração para receber Jesus.
Portanto, o importante é ouvir. Jesus certamente apreciava o trabalho de Marta, mas não aprovava que ela pensasse só no trabalho.
Hoje devemos juntar as duas coisas: o trabalho e a escuta da Palavra, porque a melhor parte não é aquela que multiplica as coisas; a melhor parte é aquela que torna Deus presente em nós; então, o silêncio é mais eloqüente do que todas as palavras. No meio da escuridão do mundo de hoje, a escuta se torna difícil.
Propósito:
Pai, que o meu agir não seja movido por um ativismo
insensível à palavra de Jesus. Antes, seja toda a minha ação decorrência da
escuta atenta desta palavra.
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