04 outubro – No segredo se forma o herói, tal como
desabrocha a semente na natureza. (L 23). São Jose Marello
Leitura do santo Evangelho segundo São Mateus 21,33-43
"- Escutem outra parábola: certo agricultor fez uma plantação de uvas e pôs uma cerca em volta dela. Construiu um tanque para pisar as uvas e fazer vinho e construiu uma torre para o vigia. Em seguida, arrendou a plantação para alguns lavradores e foi viajar. Quando chegou o tempo da colheita, o dono mandou alguns empregados a fim de receber a parte dele. Mas os lavradores agarraram os empregados, bateram num, assassinaram outro e mataram ainda outro a pedradas. Aí o dono mandou mais empregados do que da primeira vez. E os lavradores fizeram a mesma coisa. Depois de tudo isso, ele mandou o seu próprio filho, pensando: "O meu filho eles vão respeitar." Mas, quando os lavradores viram o filho, disseram uns aos outros: "Este é o filho do dono; ele vai herdar a plantação. Vamos matá-lo, e a plantação será nossa."
- Então agarraram o
filho, e o jogaram para fora da plantação, e o mataram.
Aí Jesus perguntou:
- E agora, quando o
dono da plantação voltar, o que é que ele vai fazer com aqueles lavradores?
Eles responderam:
- Com certeza ele vai
matar aqueles lavradores maus e vai arrendar a plantação a outros. E estes lhe
darão a parte da colheita no tempo certo.
Jesus então perguntou:
- Vocês não leram o que
as Escrituras Sagradas dizem?
"A pedra que os
construtores rejeitaram veio a ser a mais importante de todas.
Isso foi feito pelo
Senhor e é uma coisa maravilhosa!"
E Jesus terminou:
- Eu afirmo a vocês que
o Reino de Deus será tirado de vocês e será dado para as pessoas que produzem
os frutos do Reino. "
Meditação:
Vários setores significativos de Israel, no passado, de forma arrogante, se consideravam “o povo eleito e escolhido” diretamente por Javé.
Javé, ou seja, “Aquele que está-com-o-seu-povo” devia ser adorado de forma exclusiva, pois Ele era único. Um deus ciumento que não aceitava que outros deuses sentassem ao seu lado e fossem adorados com igual piedade e submissão.
Evidentemente, tudo isso não é fruto de revelação privilegiada, nem de predileção divina, mas é expressão de uma autoconsciência de caráter coletivo, frequentemente manipulada pelos setores palacianos monárquicos interessados em exigir e manter obediência, devoção e exclusividade do povo ao deus do rei. Era claramente uma estratégia política para manter coesão social e unidade nacional.
Admitir a diversidade de deuses significaria reconhecer um pluralismo de identidades e de projetos politicamente perigosos.
A própria Bíblia que é uma coletânea extremamente multiforme de experiências, visões, sonhos, projetos sociais e religiosos vivenciados por inúmeros e variados grupos sociais revela as suas próprias contradições. Mas isto manifesta, de forma paradoxal, que nem todos engoliam o que as classes dirigentes queriam enfiar goela abaixo.
Jesus o hebreu da Galiléia, como muitos dos seus patrícios comungava, a
princípio, a ideia de que Javé havia escolhido Israel, entre outros povos, como
sendo o Seu povo.
Escolheu-o para ser luz, guia, exemplo a ser seguido. Ele também achava que somente “as ovelhas perdidas de Israel (e não de outros lugares!)” deviam merecer um cuidado e uma atenção especiais.
Os estrangeiros, os “não israelitas” poderiam sim aceder ao grande banquete, mas só quando todo Israel fosse reunido sobre o grande monte e estivesse já sentado à mesa.
Em que pese tudo isso, Jesus nunca renunciou à sua visão e consciência crítica e autocrítica resultado de sua permanente convivência com "os invisíveis" de Israel, os "não-escolhidos".
Jesus vinha percebendo em suas andanças que muitos setores de Israel se escondiam atrás da falsa segurança de se sentirem eleitos e depositários da benevolência divina, para praticarem do tipo de opressão e iniquidade. Usavam indevidamente o nome de Javé e a sua suposta proteção-predileção para “não produzir frutos de justiça”.
“Vocês acham que vão
escapar da ira divina só porque vocês se acham filhos de Abraão (escolhidos)?
Se for só por causa disso, eu vos digo que Deus pode fazer filhos de Abraão
também dessas pedras. Mas se vocês não produzirem frutos de justiça o machado
já está posto na sua raiz e vocês todos irão ser cortados” (Lc.
3,8-9)
Jesus, como os grandes profetas críticos e destemidos, na parábola desse domingo, mais uma vez, desnuda a falsa prática religiosa, detona a arrogante autoconvicção de pertença ao povo eleito, desmascara a hipocrisia que se dá mediante os cultos apaziguadores da consciência e da responsabilidade social.
Sem meio-termo Jesus proclama o novo critério de pertença divina, ou seja, a capacidade de produzir frutos ao cuidar com amor, dedicação, responsabilidade e competência da vinha/ vida/humanidade/sociedade/universo/Reino de Deus.
Ao fazer isto, Jesus sentencia, - sem direito a novo recurso, - o fim da suposta predileção divina a partir de critérios de nacionalidade, de pertença/frequência religiosa/sacramental, cultural, opção ideológica/sexual etc, subordinando-a ao critério de produção de frutos.
A prática da verdadeira caridade, do serviço gratuito em favor da vida. “Por isso eu vos afirmo que o Reino de Deus vos é tirado (futuro próximo e não remoto) e confiado a um “povo-grupo” que produza seus frutos” (Mt. 21,43). Tem falado em nome de Deus?
Esta parábola, desenvolvida no estilo narrativo, como algumas outras semelhantes de Mateus, parte de uma imagem que implica em uma relação de poder comum nas sociedades.
Aqui temos o conflito entre o proprietário e os arrendatários. Desta relação de poder emergem detalhes de violência envolvendo ambas as partes.
A sua interpretação deve ser cuidadosa, evitando-se uma imagem final de um deus violento e vingativo, a qual é muito característica do Antigo Testamento.
O profeta da Galiléia zomba das pretensões privatizadoras dos ortodoxos e mostra que Deus entrega o Reino àquelas comunidades que vivem o amor e a justiça.
O Reino não
é propriedade privada de ninguém nem de nenhum grupo em particular. Ninguém
possui um título assegurado de uma oração ou religião concreta.
Toda a vida
e ministério de Jesus são compromissos com a vida. Suas ações e palavras
convocam todos a partilhar sua vida na nova realidade humana que a construção
do Reino provoca: suas obras poderosas, sua acolhida dos excluídos, o anúncio
da utopia de Deus que abre novos horizontes de esperança no coração dos pobres.
Estes e
outros sinais são manifestações da vontade do Pai que envia Jesus para que os
filhos e filhas “tenham vida e a tenham em abundância” (Jo 10,10) e que, por
isso, convida a celebrar o retorno do filho “que estava morto e voltou à vida”
(Lc 15,32). O amor e a justiça unem a todos na paz e seus frutos
permanecem para sempre.
As denúncias
de Jesus, por outro lado, indicam-nos que o mensageiro do Deus da Vida não pode
permitir que o ser humano esteja permanentemente torturado pelas experiências
de morte.
Queremos que
nossa vida e nosso ministério sejam uma confissão e um testemunho de nossa fé
no Deus “que ama a vida” (Sb 11,26).
Como
seguidores de Jesus, sabemos que esta vida se manifesta e goza de plenitude
quando se põe totalmente a serviço do Reino (Mt 10,39).
Jesus, o
Filho do homem, está disposto a dar sua vida em resgate por todos (Mt 20,28.
Ninguém lhe tirou a vida; ele a entregou livremente.
Com ele
aprendemos que ser bom pastor é desdobrar-se pelo rebanho, dar a vida pelos
irmãos (Jo 10,11). Neste momento, devemos unir-nos a tantos cristãos e cristãs
que nos últimos anos optaram por servir à vida, embora com risco de perder ou
complicar a sua própria. Ao fazê-lo, prolongamos a melhor tradição cristã,
confiados na intercessão de nossos irmãos e irmãs mártires.
Reflexão Apostólica:
Alguns de nós continuamos presos a um “serviço da palavra” mais apto para
gerações passadas que para a sociedade atual. Pretendemos fazer ouvir uma
“palavra” dissociada da realidade que vivemos, expressa em linguagem teórica,
com pouco sabor da vida e da problemática do povo...
A inculturação continua sendo uma “matéria pendente” para muitíssimos
pregadores cristãos. Perguntamo-nos como conseguir que nosso “serviço da
palavra” se inspire e se encarne nos compromissos concretos pela Vida, Justiça
e Solidariedade verdadeiras, tal como se vivem no dia-a-dia...
Fazemos das Escrituras o que os vinhateiros fizeram do filho:
apoderaram-se dele e mataram-no. Matar é, evidentemente, fazer calar ou
desvirtuar, fazer perder a força, esterilizar. As figuras que transportam um
texto esperam não apenas um leitor mas um intérprete.
Na parábola dos vinhateiros posso ler a história de
vinhateiros que tentam apropriar-se duma vinha e dos seus frutos matando o
herdeiro.
Podemos ler nela o fracasso da parábola porque os fariseus endossam o papel
dos vinhateiros na sua relação com Jesus. Mas podemos também recebê-la
como um apelo a não os imitar.
Que relação temos com essa pedra rejeitada pelos construtores? De quem falam
as Escrituras? É dele que falam? E você, interlocutor desta parábola, antes de
mais, e você hoje que a escuta, em que ponto se situa relativamente à leitura
das Escrituras em Jerusalém?
Convidados pelo Senhor somos todos responsáveis pelos frutos do reino
edificado a partir de nossas ações. Deus, nosso Pai, o “dono da vinha” espera
que correspondamos com os frutos devido na época esperada (da colheita) no
mundo e nas diversas situações que vivemos.
A imagem da vinha é muito apreciada no contexto bíblico pois nos remete a
necessidade de um cuidado todo especial desde o cultivo até a colheita da
safra.
Em circunstâncias severas de tempo, ter um terreno fértil e de boa
produtividade é manter a esperança de um bom resultado pelos frutos esperados.
Lembrando o episódio da “vinha de Nabot” em 1 Rs 21, 1-7, a vinha é o lugar
onde a vida germina, floresce e dá bons frutos. Também é ameaçada pela cobiça,
inveja e pelo mal que nos rodeia com a força que a morte traz!
Todavia, na liturgia desse Domingo somos convidados a nos deixar questionar
pela palavra de Deus acerca do tipo de fruto que nossas atitudes representam;
seriam estes frutos doces e maduros que alegram o coração de quem tudo investe
continuamente em nós, ou pelo contrário, nossas ações são ainda do tipo
selvagem e rebeldes contra aquele que tanto nos ama.
Nos relatos bíblicos apresentados tomamos consciência da gravidade de não
produzir frutos: “o reino vos será tirado e será entregue a um povo que
produzirá frutos”.
Assim ninguém pode pensar em possuir certa “estabilidade”, pois o reino
possui uma dinâmica toda própria capaz de superar quem fechar o coração e não
corresponder no amor as suas exigências. Como, então, produzir frutos para o
reino de Deus?
Paulo quando escreve aos Filipenses nos mostra o caminho: Primeiramente o
valor da vida de oração que nos leva a quietude diante das dificuldades, depois
deveremos focar as nossas atenções e esforços no que é verdadeiro, respeitável,
justo, amável, honroso, virtuoso e louvável, portanto um caminho de perfeição
composto por sete itens, que muito bem poderíamos apresentar como um caminho de
uma vida nova em Deus.
Que o Senhor o bom pastor nos encontre sempre em bons frutos de vida e
abençoe as sementes do reino que semeamos com o trabalho de nossas mãos.
Propósito:
Pai, transforma-me numa
vinha fecunda onde encontres os frutos de amor, justiça e solidariedade tão
esperados. Que eu jamais te decepcione, levando uma vida estéril.
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