03 dezembro - Deus faz
sempre o que é melhor para nós. (S 176).
São Jose Marello
Marcos 13:33-37
Ficai de sobreaviso, vigiai; porque não sabeis quando será o
tempo.
Será como um homem que, partindo em viagem, deixa a sua casa e delega sua
autoridade aos seus servos, indicando o trabalho de cada um, e manda ao
porteiro que vigie.
Vigiai, pois, visto que não sabeis quando o senhor da casa voltará, se à tarde,
se à meia-noite, se ao cantar do galo, se pela manhã,
para que, vindo de repente, não vos encontre dormindo.
O que vos digo, digo a todos: vigiai!
*Neste domingo, a Igreja inicia mais um ano litúrgico, convidando-nos a, mais uma vez, percorrer o caminho de Jesus Cristo, contemplando e vivendo o mistério da sua vida, morte e ressurreição. Advento é a palavra que designa a primeira etapa do ano litúrgico, cujo sentido literal é a vinda ou visita. Trata-se de um tempo especial que a Igreja dedica à preparação para a magnífica celebração do Natal do Senhor, expressão maior da visita definitiva de Deus à humanidade.
Com o início do novo ano litúrgico, iniciamos também a leitura do
Evangelho segundo Marcos, porém, não do seu início, mas do seu final,
precisamente do seu pequeno discurso escatológico, comparado ao de Mateus. Por
isso, o texto proposto para hoje é Mc 13,33-37. O discurso escatológico está
presente nos três evangelhos sinóticos (Mateus, Marcos e Lucas), e trata das
realidades últimas e finais da história, antecedendo as narrativas da paixão,
morte e ressurreição de Jesus.
Ainda a respeito do contexto, é necessário recordar o versículo
que precede de imediato o nosso texto: “Ora, a respeito daquele dia ou
hora, ninguém sabe, nem os anjos no céu, nem o Filho, mas somente o Pai” (Mc
13,32). Como sabemos, passados alguns anos após a ressurreição, os cristãos começaram
a inquietar-se, pois esperavam com muita ansiedade pela segunda vinda do Senhor
e, como essa não acontecia, muitos desanimavam, sobretudo quando começaram as
perseguições. Por isso, explorou-se bastante a pregação sobre a
imprevisibilidade dessa vinda, enfatizando que o importante é manter vivo o
espírito de vigilância, sem preocupação com o dia ou a hora.
Foquemos, pois, em nosso texto: Mc 13,33-37. A palavra-chave desse
pequeno texto evangélico é o imperativo “vigiai”; a mesma ocorre três vezes
(vv. 33.35.37) embora a versão litúrgica omita uma delas, infelizmente: “Cuidado!
Ficai atentos, porque não sabeis quando chegará o momento” (v. 33). Ao
invés de “Cuidado! ficai atentos”, seria mais adequado: “abri
os olhos e vigiai”, por corresponder melhor à expressão grega “blépete
agrípneite”. Diante da indefinição, não há outra saída para a comunidade a não
ser a vigilância. Esse versículo prepara o leitor/ouvinte para a pequena
parábola que vem a seguir, mostrando como deve ser feita essa vigilância.
Eis a continuação: “É como um homem que, ao partir, para o
estrangeiro, deixou sua casa sob a responsabilidade de seus empregados,
distribuindo a cada uma sua tarefa. E mandou o porteiro ficar vigiando” (v.
34). Em apenas um versículo, Marcos consegue transmitir uma parábola
extraordinária, modificada e ampliada por Mateus e Lucas (cf. Mt 25,14-30 =
parábola dos talentos // Lc 19,11-28 = parábola das dez minas). A partida do
homem para o estrangeiro equivale ao intervalo temporal entre a ascensão e a
tão esperada, porém desconhecida, segunda vinda do Senhor.
O evangelista quer ensinar à sua comunidade que, ao invés de
preocupar-se com questões relativas ao tempo em que o Senhor virá, o importante
é trabalhar para a sua mensagem manter-se viva e atuante na vida das pessoas,
uma vez que Ele nunca se ausentou da comunidade que nunca deixou faltar o amor.
Para isso, é importante que cada membro sinta-se responsável, como servo bom e
fiel, ao bem-estar da casa. Surpreende o uso da imagem da casa: sinal de
universalidade, ao contrário da vinha, por exemplo, imagem exclusiva do povo de
Israel, e ao mesmo tempo, sinal das pequenas comunidades, nas quais todos se
conhecem e devem viver em comunhão, a partir de relações movidas pelo amor, a
justiça e a solidariedade. Na casa, enquanto, família, todos são iguais:
empregados e porteiros, com a mesma responsabilidade de não deixar faltar o
amor e a concórdia, bem como o pão material, tão necessário para o dia-a-dia.
O perigo de esfriamento na vivência da fé era tão grande, a ponto
de ser necessário insistir no imperativo “vigiai”; assim, prossegue o versículo
seguinte: “vigiai, portanto, porque não sabeis quando o dono da casa
vem: à tarde, à meia-noite, de madrugada ou ao amanhecer” (v. 35).
Sendo o Senhor o dono da casa, aos servos compete apenas vigiar. Porém, é
necessário ressaltar, mais uma vez, a natureza dessa vigilância tão cara ao
Senhor; não se trata de busca por segurança ou conforto, mas simplesmente de
manter o evangelho vivo e atuante na vida das pessoas. A comunidade vigilante é
aquela na qual os sinais do Reino se manifestam: amor e justiça em abundância.
Onde esses valores abundam, o que menos tem importância é o tempo. Inclusive,
quanto mais tardar o Senhor, mais frutos a casa/comunidade terá gerado; por
isso, o cristão só pode ter pressa em uma coisa: em fazer o bem!
O motivo da vigilância é muito claro: “Para que não suceda
que, vindo de repente, ele vos encontre dormindo” (v. 36). É claro que
o texto não se refere ao dormir como a necessidade natural do ser humano, pois
dessa ninguém pode privar-se, mas como a indiferença e a omissão em relação aos
valores do evangelho. Nesse caso, dormir significa deixar de praticar a
mensagem de Jesus Cristo, abandonar seu ensinamento. Mais que triste, é até
trágico quando uma comunidade abandona a mensagem libertadora do evangelho,
deixando de praticar o amor, a justiça e a solidariedade, ou seja, quando não
tem mais a fraternidade como sinal distintivo. Por isso, o convite é novamente
reforçado e, agora, com a sua dimensão universal mais explícita ainda: “O
que vos digo, digo a todos: Vigiai!” (v. 37). Todos da comunidade, e
em todos os tempos, são convocados à vigilância da prática do amor.
Não importa quando o Senhor virá pela segunda vez. Procuremos
celebrar a sua primeira vinda, ou seja, o natal, como certeza de que Ele já
veio e conosco está; porém, sua presença constante não será percebida enquanto
não assumirmos a nossa responsabilidade na casa que Ele nos confiou: a família,
a comunidade, o universo como “casa comum”. Para celebrarmos bem a certeza de
que Ele já veio, só nos resta mantermo-nos acordados, ou seja, praticando o
amor, acima de tudo. Vigiar é isso!
O pescador e seu riacho
Padre Geraldo Orione de Assis
Silva
Passado algum tempo, o pescador
foi envelhecendo e ficou sem forças para pescarias mais ousadas. Não queria
pegar o barco para atravessar o rio; não queria ir até rios mais distantes; só
queria pescar na curva de um rio bem pertinho de sua casa, lá onde uma árvore
tombada formava um confortável assento pra ele descansar.
Toda tarde, o velho pescador
pegava seus apetrechos e ia para o rio. Assentava-se confortavelmente no galho
tombado, pendurava sua matula num galho ao lado e passava horas pescando. Já
não interessava mais se pegava peixes pequenos ou grandes; acostumou-se àquele
lugar e pescar ali tornara-se seu passatempo preferido.
Certa vez, uma tempestade se
abateu sobre a região. Uma enchente enorme fez transbordar as águas do rio,
mudando o seu curso para um ou dois metros dali. Bem lá na curva do rio onde o
pescador pescava, formou-se uma banca de areia com um filete minúsculo de água
sobre ela. A árvore com seu galho tombado continuava ali, bem no lugar de
sempre, oferecendo ainda seu confortável assento ao hóspede de todos os dias.
Passados os dias da enchente e
recuperada a normalidade da vida, nosso pescador juntou as malas e foi pescar,
afinal a rotina se estabelecera de novo com o baixar das águas. Para surpresa
de toda a comunidade, o pescador foi direto para a curva do rio, onde formara
um banco de areia. Assentou-se em seu galho preferido, pegou a vara, colocou
anzol na isca e ficou dando banho em minhoca num filete de água sobre o
amontoado de areia que ali se ajuntara. Nenhum peixe, é claro! Mas contam seus
contemporâneos que o pobre pescador fez a mesma coisa todos os dias, até o fim
de seus dias. Acostumado como estava à sua zona de conforto não foi capaz de
inovar, mesmo com toda a sua experiência pregressa.
Por isso, fique firme nos bons
hábitos, mas esteja sempre atento ao novo. Passam-se os anos, mudam-se os
tempos. Somos chamados a inovar para manter a vida fluindo...
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